sexta-feira, 20 de novembro de 2015

O MAR DE LAMA DO CRIME AMBIENTAL DA SAMARCO, EMPRESA DA VALE DO RIO DOCE.

JORNAL COMENTADO 242
10:58 - Sexta-feira, 20 - 2015

Coluna Raio Laser, jornal "Tribuna da Bahia"

"Mentiras e descaso (ainda sobre o mar de lama)

Alex Ferraz 
Dilma, Aécio e Marina tiveram gordas contribuições da Vale do Rio Doce para suas campanhas eleitorais


Insisto em tratar aqui do tremendo escândalo em que se transformou o rompimento de uma das centenas de barragens de mineração existente no Brasil, neste caso em Minas Gerais, estado que tem o maior número delas. Faço isso porque, sem falsa modéstia – e embora nem de longe seja especialista no assunto -, fui seguramente um dos primeiros na imprensa nacional a chamar a atenção, logo no dia seguinte ao desastre, e enquanto toda a mídia pisava em ovos para tratar do tema, para o fato de que estávamos (e ainda estaremos, talvez até por mais de um século) vivendo o pior desastre ecológico no Brasil. Aliás, como classificou um especialista em entrevista, ontem, à BandNews TV, este é um dos cinco maiores desastres ecológicos do mundo, colocando-se ao lado – e de certa forma até com maior gravidade, devido à extensão da área atingida – de Chernobyl (1986, na antiga União Soviética) e do ocorrido na cidade italiana de Seveso, onde, em 10 de julho de 1976, tanques de armazenagem na indústria química ICMESA romperam, liberando vários quilogramas da dioxina TCDD na atmosfera e o produto espalhou-se por grande área na planície  entre Milão e o Lago de Como. Devido à contaminação, três mil animais morreram e outros 70 mil tiveram que ser sacrificados para evitar a entrada da dioxina na cadeia alimentar. Acredita-se que não tenha havido mortes de seres humanos diretamente vinculadas ao acidente, mas 193 pessoas nas áreas afetadas sofreram de diversos sintomas.
Pois bem. Voltando ao Brasil, o desastre de Minas, cuja lama tóxica deve chegar neste fim de semana ao Oceano Atlântico, na costa do Espírito Santo, podendo destruir corais, matar peixes, destruir a flora e mesmo afetar as baleias no santuário de Abrolhos, já na Bahia, sofreu cínicas e revoltantes tentativas de minimização, tanto da parte de autoridades do governo estadual mineiro e do federal, como, claro, dos dirigentes da Vale, em resumo, a responsável pela empresa Samarco, diretamente ligada à barragem.

São mentiras que se diria “comuns” em governos e empresas de quase todo o mundo (com exceção rara e honrosa, claro, de algumas sociedades com alto nível de civilidade), mas que, na maioria das nações um pouco mais sérias, podem derrubar governos e fechar empresas.
Aqui, jamais. Começa que a Vale, responsável geral pela mineração, financiou campanhas eleitorais de muita gente, inclusive da própria presidente da República, Dilma Rousseff, e do governador de Minas, Fernando Pimentel. Aliás, este chegou à atitude patética de antecipar-se às declarações da própria empresa, logo após o desastre, garantindo que a lama não era tóxica e minimizando de forma criminosa os efeitos, hoje vistos por todos, catastróficos do evento.
Entre outros que receberam fortunas da Vale para suas campanhas estão, vejam só, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, o senador Aécio Neves e a ex-senadora Marina Silva. De acordo com dados do próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o chamado “Clube dos Seis” financiado pela Vale engloba os seguintes partidos e quantias: PMDB, R$ 23.550.000; PT, R$ 8.250.000; PSDB, R$ 6.960.000; PSB, R$ 3.500.000; PP, R$ 1.500.000 e, ora, ora, o PCdoB, com R$ 1.500.000.

Não é à toa que o novo Código de Mineração, em processo de análise e votação no Congresso, estabelece mil vantagens e prioridades para as mineradoras (de forma escandalosa, pode crer) e determina, de forma explícita, que elas têm prioridade sobre populações e áreas de outro tipo de atividade. Todos, no Congresso, trabalhando a soldo da Vale e, claro, desdenhando da vida e da economia dos milhões de eleitores comuns que os colocaram lá.
Bem, fala-se que os efeitos dramáticos do desastre levarão, no mínimo, DÉCADAS para serem sanados (pela própria natureza), e, em alguns casos, a recuperação total, pasmem, pode durar até 150 anos, conforme entrevistas de especialistas que, agora, duas semanas do ocorrido, foram procurados com seriedade por parte da mídia.

A lama é ALTAMENTE tóxica e pode levar à contaminação por cromo, manganês e mercúrio, entre outros metais tóxicos, alguns deles causando câncer.
Vejamos algumas informações científicas:

MERCÚRIO
A contaminação por mercúrio provoca:
Náuseas, vômitos, diarreia, aumento da pressão arterial e, a longo prazo, problemas nos rins ou cérebro, assim como, alterações na visão, audição e problemas de memória.
As fontes de contaminação podem ser águas contaminadas com mercúrio, contato direto com o interior das lâmpadas e pilhas e alguns tratamentos dentários.

CROMO
A  inalação ou ingestão de cromo pode provocar:
Irritação no nariz, dificuldade para respirar, asma e tosse constante. Já a longo prazo, podem surgir lesões permanentes no fígado, rins, sistema circulatório e pele.

MANGANÊS
De acordo com artigo científico publicado no site Trabalhoseguro.com.br, “a semelhança entre a intoxicação pelo manganês e o parkinsonismo pressupõe mecanismos de ação também semelhantes, como, por exemplo, as alterações no metabolismo das catecolaminas do cérebro, especialmente a Dopamina. Outra alteração importante é a degeneração e redução da melanina da substância negra, estrutura que, junto com o corpo estriado e o globo pálido, participam do sistema extrapiramidal. Em resumo: um desastre para o sistema nervoso.

E MAIS
A contaminação com metais pesados pode levar meses ou anos para se manifestar, mas é importante que o tratamento inicie o mais cedo possível para evitar complicações de saúde.
 Para encerrar: alguém aí acredita que a Vale e sua empresa subsidiária vão mesmo pagar os mais de R$ 1 bilhão que somam as multas já aplicadas e aquelas ameaçadas? Particularmente, duvido solenemente. Sabemos como a Justiça brasileira é pródiga em liminares favoráveis aos réus e até mesmo atrasos propositais em processos que envolvem governos ou grandes empresas. Apela-se aqui, apela-se ali, e, no frigir dos ovos, se houver, a multa e/ou a indenização serão de valores pífios.
Quantos aos políticos e governantes, como já ficou explícito aqui, são, na sua maioria, servos da Vale e não gente preocupada com a sociedade. Ah, sim, um lembrete: as queimadas, da Bahia a Goiás, e inclusive na Amazônia, são criminosas, mas seus autores, podem crer, terão carta branca para destruir a natureza. E haja saco!

DA LAMA AO CAOS
 O Departamento Nacional de Produção Mineral, DNPM, entre cujas funções estão a autorização da instalação de mineradoras e a fiscalização das mais de 700 barragens de mineração existentes no Brasil, está literalmente falido. Tem apenas cinco técnicos de alta especialidade para cuidar de tudo isso. E o dirigente pediu demissão uma semana após o desastre de Minas Gerais. Não há verbas para nada, só cargos para agradar a políticos. É um retrato deste País.

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